Kassel, uma cidade situada no coração da Alemanha, em 1939 tinha 236.000 habitantes. Em abril de 1945, havia apenas 50 mil. Em 1800, era uma das mais belas cidades da Europa central. Teve o primeiro museu púbico do continente, o Fridericianum, construído em 1779, e parcialmente destruído nos bombardeios de novembro de 1944. Abrigou o primeiro teatro alemão e, de Kassel, os Irmãos Grimm disseminaram seus contos por todo mundo.
O enorme parquet de Whilhelmshöhe, com seu octógono coroado por Hércules e sua cascata, deram as mãos com a perfeita harmonia e espírito romântico alemão e sua inefável eficiência técnica, alvo de uma campanha de bombardeio contínua, que começou no início de 1942 e durou quase até o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945.
Durante o bombardeio mais pesado e mais intenso, na noite de 22-23 de outubro de 1943, a Real Força Aérea Britânica atacou com 569 bombardeiros sobre o centro da cidade. A explosão concentrada de 1.800 toneladas de bombas incendiárias resultou numa tempestade letal e um incêndio que durou 7 dias.
Arnold Bode, artista, desenhista, curador e professor, nascido em Kassel em 23 de dezembro de 1900, foi forçado a deixar Berlim, onde trabalhou de 1928 a 1933 quando banido de sua profissão pelos nazistas. Compreendia o papel da arte na sociedade e a função de valores simbólicos que, aplicados ao contexto social, poderiam determinar a cultura inteira de uma era.
Bode fundou a "documenta", em 1955, a maior exposição de arte contemporânea do mundo. Surgiu nas ruínas caiadas do museu Fridericianum. Os 130 mil visitantes puderam apreciar 670 obras de 148 artistas das vanguardas modernas, entre os quais Pablo Picasso, Paul Klee e Marc Chagall.
A Documenta é hoje uma das principais exposições de arte contemporânea do mundo e atrai um grande número de visitantes, a cada cinco anos, durante 100 dias. Um projeto que nasceu da necessidade de lançar luz sobre a produção artística das últimas gerações pertencentes aos anos de opressão e ditadura na Alemanha na década de 1930.
Ainda ouço muitos relatos sobre a história de mais de 8 décadas atrás. Meu avô materno, nascido em Kassel, Herbert Fanghaenel, neto de Hans Fanghaenel, arquiteto do teatro parcialmente destruído na Segunda Guerra, voltou para a Alemanha com a família em 1939. Pai, mãe e filhas, ainda meninas, vão ao encontro de um sonho, um pesadelo não anunciado que durou 6 anos. Pessoas ainda guardam destroços. A cidade se reergueu, bombardeada de forma tão dura por causa de sua importante indústria militar. E a arte vai mostrando o espírito de seu povo e do seu tempo.